quinta-feira, 8 de maio de 2014

DO DESENHO DE PALAVRAS À PALAVRA DO DESENHO Escrito por RICARDO OTTONI VAZ JAPIASSU

DO DESENHO DE PALAVRAS À PALAVRA DO DESENHO
Escrito por RICARDO OTTONI VAZ JAPIASSU
Qui, 29 de Janeiro de 2004 00:00
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Do desenho de palavras à palavra do desenho
ARTICLE’S TITLE
From designing words to giving design a chance to speak

RESUMO
O artigo expõe a evolutiva do grafismo infantil segundo a perspectiva da psicologia sócio-histórica e apresenta uma proposta terminológica original para a etapização do desenvolvimento gráfico-plástico infantil. Discute ainda a problemática relativa à formação do professor em arte-ensino na educação infantil e séries iniciais da escolarização nacional.

ABSTRACT
The article exposes a historical-cultural psychological approach to child’s art and proposes an original taxonomy to its developmental features. It also presents some problems related to art-teaching on training teachers’ programs in brazilian children education and first grades of schooling today.


PALAVRAS-CHAVE
Arte infantil - educação infantil – ensino de arte – formação de professores – psicologia sócio-histórica 

KEY-WORDS
Child art – children education – arts teaching – teachers trainning – cultural historical psychology

DO DESENHO DE PALAVRAS À PALAVRA DO DESENHO
Prof. Ricardo Ottoni Vaz Japiassu[1]
Universidade do Estado da Bahia-Uneb

 “Seria totalmente injusto pensar que todas as possibilidades criadoras das crianças se limitam exclusivamente às artes. Lamentavelmente a educação tradicional, que tem mantido as crianças alijadas do trabalho, fez com que elas manifestassem e fomentassem sua capacidade criadora preferentemente na esfera artística.”                                                      Lev Vygotsky y

Artes e formação de professores
            A problemática relativa ao ensino das artes no país, hoje, põe em cheque a formação de professores oferecida nas licenciaturas em arte (Artes Visuais, Dança, Música e Teatro), nos cursos de pedagogia, em escolas normais superiores, habilitações para o magistério de nível médio e em programas para o aperfeiçoamento em serviço do educador.
(1) Que tipo de (in)formação os profissionais da educação estão tendo para trabalharem com seus alunos, de modo sistemático, as diferentes linguagens artísticas?
(2) Se a habilitação para o magistério na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental é prerrogativa do pedagogo, por que nos cursos de pedagogia e de formação de professores não são oferecidas disciplinas que contemplem a especificidade estética de cada uma das linguagens artísticas (Artes Visuais, Dança, Música e Teatro)?
(3) Por que não se busca sinalizar procedimentos metodológicos para o trabalho sistemático na escolarização com cada uma das linguagens artísticas em cursos que têm como objetivo a formação dos profissionais da educação que irão atuar nas creches, pré-escolas e séries iniciais do ensino fundamental?
(4) Se cabe aos artistas, arte-educadores e aos professores de arte (egressos das licenciaturas em Artes Visuais, Dança, Música e Teatro) o trabalho pedagógico com as artes na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental (1ª à 4ª série) por que é tão rara a presença desses profissionais nestes níveis da escolarização básica?
Parece-me que evitar formular questões como as que são apresentadas acima - ou não procurar respondê-las - revela uma silenciosa orquestração no sentido de “deixar tudo como está pra ver como é que fica”. Então quero expor aqui meu ponto de vista em relação a essa problemática.
Se, por um lado, não tenho a ambição de ser “dono da verdade”, por outro, proponho um equacionamento não desinteressado do problema. Meu entendimento é o de que o professor da educação infantil e das séries iniciais é essencialmente “polivalente”, ou seja, é aquele profissional “licenciado” para realizar a transposição didática dos conhecimentos de diferentes áreas do saber em creches, pré-escolas e nas séries iniciais do ensino fundamental (1ª à 4ª série).
Ora, não se tem notícia de professores de matemática ou de língua portuguesa, por exemplo, atuando na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental. As licenciaturas em matemática e língua portuguesa têm em vista o exercício do magistério da 5ª à 8ª série do ensino fundamental e ao longo do ensino médio. O mesmo ocorre com as licenciaturas para o ensino das demais áreas do conhecimento (artes, educação física, ciências naturais, história e geografia) (Brasil, 1998, 1997).
Os cursos de pedagogia precisam, do ponto de vista que se defende aqui, assumir a especificidade da formação profissional que se propõem a oferecer criando condições de igualdade no oferecimento das diretrizes metodológicas para o trabalho pedagógico com todas as áreas de conhecimento.
Afinal a licença para o exercício do magistério na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental é prerrogativa do pedagogo. Essa licença é o “caroço” da sua identidade profissional. Abrir mão disso significa por em risco a existência dos cursos de pedagogia. É necessário portanto o compromisso das faculdades de educação para com a elaboração de uma matriz curricular que não comprometa a excelência do ensino de arte que os artistas, arte-educadores e professores de arte brasileiros almejam e têm perseguido historicamente (Japiassu, 2002, p. 49-54).
Eu, por exemplo, sou bacharel e licenciado em Teatro, mestre em Artes Cênicas mas tenho lecionado na Uneb unicamente Metodologia do Ensino de Artes Visuais - embora Metodologia do ensino de Dança, Metodologia do ensino de Teatro e Musicalização Infantil devessem elencar os componentes curriculares do curso de pedagogia. Nenhuma dessas linguagens costuma ser trabalhada satisfatoriamente com os futuros professores. 
O leitor certamente deve estar se perguntando as razões pelas quais um especialista em Artes Cênicas conduz intervenções pedagógicas com a linguagem plástica em cursos de pedagogia. Respondo:
Em primeiro lugar, até o presente, só foi possível “encaixar” como componente curricular, nos cursos de pedagogia da Uneb/Campus X, onde atuo, uma única linguagem artística. Em parte, isso significa algum avanço - mas ainda resiste aquele entendimento de que o ensino de arte deve ser um mosaico condensado das diferentes formas de expressão estética. O fato é que a linguagem das Artes Visuais foi “eleita” no campus X para ser prioritariamente trabalhada com os futuros professores, em razão de a construção dos processos de representação do desenho e da escrita possuírem, em seus inícios, uma trajetória comum. Entendo que é preferível focalizar apenas uma das linguagens artísticas do que “borboletear” de modo superficial e insuficiente pelo vasto universo das artes;
Em segundo lugar, porque me sinto a vontade para conduzir intervenções pedagógicas com esta linguagem artística. Tenho procurado estar atento ao desenvolvimento da área de Artes Visuais no Brasil através de publicações especializadas (Barbosa, 1996; Deheizelin, 1998; Ferraz&Fusari, 1993a, 1993b; Moreira, 1984; Penna, 2001; Pillar, 1996a, 1996b, 1993). Além disso busco, freqüentemente, participar dos encontros (virtuais e presenciais) promovidos pela Federação de Arte-Educadores do Brasil/FAEB e dos eventos sob a curadoria da professora doutora Ana Mae Barbosa;
Por fim, pessoalmente, interessa-me muito o estudo da estética do grafismo infantil na perspectiva da psicologia sócio-histórica e de sua teoria histórico-cultural da atividade-CHAT (Azenha, 1995; De Camillis, 2002; Ferreira, 1998; Levin, 1998; Luria, 1994; Marín, 1985; Rocco, 1990; Vygotsky, 2001, 1998, 1996, 1982).
Ora, não deve ser difícil para o leitor perceber qual é o meu objetivo aqui: contribuir – ainda que modestamente – para a (in)formação das práticas pedagógicas com as Artes Visuais do(a) professor(a) que irá atuar na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental.
Busco aqui expor, de maneira objetiva, subsídios teórico-práticos para que o(a) leitor(a) tenha condições de compreender melhor e valorizar mais a expressão gráfico-plástica infantil, aproximando-o da problemática relacionada ao ensino das artes nas universidades e cursos de formação de professores.

Por uma estética do grafismo infantil
            A estética do grafismo infantil deve referir o estudo das condições de produção e efeitos da criação gráfico-plástica infantil. Trata-se de um campo de estudo que busca conhecer as condições materiais de produção do grafismo infantil e entender o psiquismo da reação estética (apreciação dos resultados perceptíveis da atividade criadora da criança).
Muitos pedagogos, psicólogos e arte-educadores buscaram conhecer melhor e entender, sob diferentes enfoques, a estética do grafismo infantil. Entre eles podemos relacionar, por exemplo, Ana Angélica Albano Moreira, Analice Dutra Pillar, Arno Stern, Celestin Freinet, Esteban Levin, Florence de Méredieu, Georg Kerschensteiner, Jean Piaget, K. Bühler, Herbert Read, Liliane Lurçat, Luquet, Luria, Rolando Valdés Marin, Rhoda Kellogg, Rudolf Arnheim, Schaefer-Simmern, Sueli Ferreira, Victor Lowenfeld, W. Lambert Brittain e Lev Vygotsky.
Esses estudiosos do grafismo infantil, sem exceção, reconhecem haver determinadas fases, etapas ou períodos que são comuns aos sujeitos em processo de apropriação do desenho enquanto sistema de representação. E, de fato, desde o rabisco sem intencionalidade de representação até a representação gráfico-plástica propriamente dita podemos claramente identificar aspectos visuais invariantes no processo de apropriação do desenho como sistema semiótico de representação por parte do sujeito.
Evidentemente a criança precisa encontrar-se imersa em um ambiente no qual o lápis e o papel, por exemplo, sejam parte do “kit de ferramentas” culturalmente disponibilizado a ela - e em efetivo uso por parte dos membros mais experientes do seu meio social. Esses objetos e seus significados culturais (lápis, papel etc) convidam explicitamente o sujeito a usá-los de um modo muito preciso. O seu significado cultural, desse ponto de vista, só pode ser efetivamente apropriado através da participação guiada do sujeito no meio social no qual ele se encontra imerso. A participação guiada se dá basicamente de duas formas: (1) a partir da observação periférica dos modos de agir com esses objetos pelos membros mais experientes do meio cultural do sujeito e (2) mediante instruções explícitas ao sujeito de como ele deve fazer uso desses objetos (Rogoff et alli, 1993).
Adiante serão expostos alguns aspectos visuais invariantes que caracterizam as etapas percorridas por sujeitos aconchegados nas culturas letradas ocidentais - e em processo de participação guiada nessas sociedades – ao longo da sua “tomada de posse” do desenho enquanto complexo sistema de representação semiótica.
Não se tem notícia – ao menos até aqui - de nenhuma tentativa de unificar, nos estudos nacionais relativos à estética do grafismo infantil, os diferentes termos utilizados pelos pesquisadores da expressão gráfico-plástica da criança.
Geralmente, as publicações nacionais que tratam do grafismo infantil costumam tomar emprestada a nomenclatura formulada por um determinado autor - em razão dele ter sido eleito o esteio teórico para penetrar o vasto continente epistemológico dos saberes sobre a expressão psicográfica da criança (p. ex: Pillar, 1996a, 1996b; Moreira, 1995).
Quando não é assim, apresentam-se exposições de diferentes concepções do desenvolvimento gráfico-plástico infantil e suas terminologias específicas para caracterizar as sucessivas fases da figuração no desenho da criança (p. ex: Ferreira, 1998).
A nomenclatura que proponho neste artigo deve servir ao propósito de sintetizar – sem reducionismos – a complexidade dos pontos de vista enredados nas abordagens à estética do grafismo infantil. Não se trata de ecletismo, mas, de simplificação.
Busco concretizar aqui a necessária transposição didática do conhecimento já historicamente acumulado na área – que, a bem da verdade, é bom que se diga, encontra-se “vivo” e em processo contínuo de (co)laboração.
Evidentemente - é claro - a escolha de uma determinada nomenclatura revela muito do lugar de onde nos propomos olhar para o nosso objeto de estudo.
Meu pensamento é o de que nenhuma das terminologias disponíveis, no momento, me parecem suficientes para situar o leitor no âmbito dos saberes já historicamente constituídos sobre o grafismo e, ao mesmo tempo, fornecer-lhe acesso à perspectiva da psicologia sócio-histórica, e de sua teoria histórico-cultural da atividade-CHAT, no que tange a abordagem ao desenho como sistema cultural de representação semiótica.
Por exemplo, a “etapização” do grafismo infantil formulada por Vygotsky deixa “de fora” todo um período da aquisição do sistema de representação do desenho que me parece de fundamental importância ser levado ao conhecimento do(a) professor(a) da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental. Somando-se a isso, o que se conhece até aqui, em língua portuguesa, a respeito da “etapização” da expressão psicográfica infantil formulada por Vygotsky resulta de traduções livres – a bem da verdade “traduções da tradução” do russo para o espanhol.
Até a elaboração deste artigo, não se tinha notícia do interesse de qualquer editora do país em adquirir os direitos de publicação em língua portuguesa do ensaio psicológico no qual Vygotsky aborda a problemática da construção do sistema semiótico do desenho - publicado em língua espanhola sob o título La Imaginación y el arte em la infância (Vygotsky, 1982).
Vygotsky, em verdade, não se propõe a investigar ali, de modo sistemático, o processo de apropriação do desenho como processo semiótico. O que ele faz naquele livro é: (1) sinalizar a matriz conceitual que deve ser utilizada na (co)laboração de conhecimentos a respeito do grafismo infantil numa perspectiva histórico-cultural e (2) destacar aspectos visuais invariantes do desenho da criança que caracterizam etapas muito nítidas do processo de desenvolvimento do grafismo, discutindo-os (Vygotsky, 1982).
Apenas no oitavo capítulo de La imaginación y el arte em la infância Vygotsky aborda o grafismo infantil. Seu interesse ali é o desenho enquanto expressão observável da imaginação criadora humana. O objetivo do capítulo é essencialmente o de demonstrar a tese da constituição social da imaginação enquanto função psicológica cultural redimensiona pelo pensamento verbal (Japiassu, 2001).
Sueli Ferreira (1998) esclarece isso muito bem: “a teoria de Vygotsky apresenta um avanço no modo de interpretação do desenho” porque “(a) a figuração reflete o conhecimento da criança; e (b) seu conhecimento, refletido no desenho, é o da sua [da criança] realidade conceituada, constituida pelo significado da palavra” (p. 40).
Então, a nomenclatura para as etapas do grafismo e a “etapização” da expressão psicográfica da criança que apresento a seguir é uma iniciativa pessoal que traduz o meu esforço docente no sentido de tentar re(a)presentar uma abordagem ao grafismo infantil que dê conta de estabelecer um elo entre os pressupostos teórico-metodológicos da teoria histórico-cultural da atividade-CHAT e o relativismo estético pós-moderno - no qual se fundamentam as diretrizes educacionais para a compreensão das produções artísticas na contemporaneidade.
Em resumo, o que faço a seguir é: (1) (re)significar o conceito de esquema apresentado por Viktor Lowenfeld e W. Lambert Brittain (Lowenfeld&Brittain, 1977);[2] (2) tomar emprestados alguns termos da nomenclatura utilizada e formulada originalmente por esses dois psicólogos (Lowenfeld, 1954); (3) buscar estabelecer um diálogo entre a nomenclatura que proponho e aquela originalmente utilizada por Vygotsky (Ferreira, 1998; Vygotsky, 1982); e (4) justificar a pertinência dos termos dos quais me sirvo para caracterizar as etapas do processo de apropriação do sistema do desenho por parte do sujeito.
Antes, porém, é meu dever apresentar ao leitor a nomenclatura e a “etapização” originalmente formuladas por Vygotsky.

A evolutiva do grafismo infantil segundo Vygotsky
Sabe-se que o primeiro estudo brasileiro que se referiu à nomenclatura utilizada por Vygotsky para caracterizar as etapas do processo de (co)laboração do desenho como sistema semiótico é o livro Imaginação e linguagem no desenho da criança da Profª. Drª. Sueli Ferreira, baseado em sua dissertação de mestrado defendida na Unicamp (1998).
Conheci a professora Suely quando ela fazia parte da diretoria da Federação de Arte-Educadores do Brasil-FAEB. Depois, sempre acabávamos nos “batendo” nos encontros da Associação de Arte-Educadores de São Paulo-AAESP ou em seminários da International Society for Cultural and Activity Research-ISCAT (Sociedade Internacional pela Atividade e Pesquisa Cultural).
Suely opta, em seu livro, por traduzir as quatro etapas às quais se refere Vygotsky respectivamente por: (1) Escalão de esquemas; (2) Escalão de formalismo e esquematismo; (3) Escalão da representação mais aproximada do real e (4) Escalão da representação propriamente dita (Idem, p. 29).
Pessoalmente prefiro denominar as etapas identificadas por Vygotsky de: (1) etapa simbólica – porque, como o próprio Vygotsky diz, “el pequeño artista es mucho más simbolista que naturalista” (Vygotsky, 1982, p. 96); (2) etapa simbólico-formalista - porque neste período já se começa a “sentirse la forma y la línea” (Idem, p. 97); (3) etapa formalista veraz (ou formalista-verossímil) - em que passa a existir uma “representación veraz” (Idem, p. 97) dos objetos desenhados e (4) etapa formalista plástica (ou formalista propriamente dita) - porque neste período já se consegue identificar “la imagem plástica” (Idem, 99).
Daqui em diante uso os termos apresentados acima para designar as etapas que caracterizam cada um dos períodos escalonados por Vygotsky. No entanto vale a pena lembrar - uma vez mais - que Vygotsky efetua um recorte no desenvolvimento cultural do grafismo infantil desprezando a “pré-história” do desenho.
A fase dos rabiscos, garatujas e “da expressão amorfa de elementos gráficos isolados” (Idem, p. 94) não interessa aos objetivos que ele possui em seu ensaio psicológico. De fato o desenho - enquanto sistema semiótico - só existe efetivamente após o período dos rabiscos.
No período dos rabiscos certamente não se pode falar de atividade representacional stricto sensu por parte da criança. A intenção de Vygotsky no livro é demonstrar as interrelações entre imaginação criadora e criação artística infantil conforme elas se apresentam e podem ser observadas ao longo particularmente de três formas de expressão estética na escolarização (Literatura, Teatro e Artes Visuais/Desenho).
Vygotsky está a discutir ali a constituição social de uma importante função psíquica cultural: a imaginação criadora. Seu objeto de estudo não é o grafismo infantil em si mas sobretudo as relações entre a imaginação criadora e a criação artística em geral da criança (Japiassu, 2001).
O desenvolvimento gráfico-plástico é abordado por Vygotsky muito rapidamente no livro. E só se justifica por ser útil ao seu empenho em demonstrar o modo como a imaginação criadora se amplia e adquire um funcionamento qualitativamente superior ao longo do desenvolvimento cultural do sujeito.
Verifica-se que a argumentação elaborada por Vygotsky, no capítulo oitavo do livro, em que aborda o grafismo infantil, é desenvolvida buscando dialogar com os resultados de pesquisas de estudiosos da expressão psicográfica da criança de sua época (Barnés, Bakushinskii, Büller, Kerschensteiner, Labunskaya&Pestel, Levinstein, Luquens, Pospiélova, Ricci, Sakúlina e Selly). O ensaio traz inclusive um pequeno anexo com a reprodução de aproximadamente duas dezenas de ilustrações coletadas por estes pesquisadores - às quais Vygotsky recorre para demonstrar a pertinência de sua “etapização”.
Os aspectos invariantes do grafismo infantil são demonstrados por ele através de desenhos de variados objetos, figuras humanas e animais elaborados por crianças de condições sociais distintas e de diferentes idades.
 Vejamos abaixo a caracterização dos períodos que ele identifica ao longo do desenvolvimento da expressão gráfico-plástica infantil - e o que os distingüe um do outro:
(1) Etapa simbólica (Escalão de esquemas) – É a fase dos conhecidos bonecos “cabeça-pés” que representam, de modo resumido, a figura humana. Trata-se da etapa na qual a visão do sujeito encontra-se totalmente subordinada ao seu aparato dinâmico-táctil. Esta etapa é descrita por Vygotsky como o momento em que as crianças desenham os objetos “de memória” sem aparente preocupação com fidelidade à coisa representada. Ou seja: os sujeitos desenham o que já sabem sobre os objetos que buscam representar procurando destacar-lhes apenas os traços que julgam mais importantes. É o período em que a criança “representa de forma simbólica objetos muitos distantes de seu aspecto verdadeiro e real” (Vygotsky, 1982, p.94). Vygotsky explica-nos que a arbitrariedade e a licença do desenho infantil nesta etapa é grande porque “o pequeno artista é muito mais simbolista que naturalista” (Destaque meu)(Ibidem, p. 96). Então, nas representações da pessoa humana, de maneira geral, nesta etapa, constata-se que o sujeito se limita a traçar apenas duas ou três partes do corpo fazendo com que os seus desenhos sejam “mais propriamente enumerações, ou melhor dizendo, relatos gráficos abreviados sobre o objeto que querem representar” (Ibid., p. 96). Mas é o período também dos chamados “desenhos-radiografia” (desenhos em que as crianças traçam pessoas vestidas mostrando suas pernas sobre a roupa).
(2) Etapa simbólico-formalista (Escalão de formalismo e esquematismo) – É a etapa na qual já se percebe maior elaboração dos traços e formas do grafismo infantil. A visão e o aparato dinâmico-tactil do sujeito lutam para subjugarem um ao outro. É o período em que a criança começa a sentir necessidade de não se limitar apenas à enumeração dos aspectos concretos do objeto que representa, buscando estabelecer maior número de relações entre o todo representado e suas partes. Há uma espécie de mescla de aspectos formalistas e simbolistas na representação plástica nesta etapa. Constata-se que os desenhos permanecem ainda simbólicos mas, por outro lado, já se pode identificar neles os embriões de uma representação mais próxima da realidade. Trata-se de um período que não se distingue facilmente da fase precedente e que se caracteriza por uma quantidade bem maior de detalhes na atividade figurativa da criança. As figuras representadas assemelham-se bem mais ao aspecto que de fato possuem a olho nu. Há nítido esforço do sujeito em tornar suas representações mais verossímeis. Porém sobrevivem ainda, nesta etapa, os “desenhos-radiografias.”
 (3) Etapa formalista veraz (Escalão da representação mais aproximada do real) – É o período em que o simbolismo que se encontrava presente nas representações típicas das duas etapas anteriores definitivamente fenece. A visão passa a subordinar totalmente o aparato dinâmico-táctil do sujeito. Nesta fase, as representações gráficas são fiéis ao aspecto observável dos objetos representados mas a criança ainda não faz uso das técnicas projetivas. Nos desenhos deste período as convenções realistas - que enfatizam a proporcionalidade e o tamanho dos objetos - são violadas com freqüência e, em razão disso, desestabiliza-se toda a plasticidade da figuração.
(4) Etapa formalista plástica (Escalão da representação propriamente dita) – Nesta etapa a plasticidade da figuração é enriquecida e ampliada porque a coordenação viso-motora do sujeito já lhe permite o uso vitorioso das técnicas projetivas e das convenções realistas. Observa-se uma nítida passagem a um novo modo de desenhar. O sujeito não mais se satisfaz com a expressão gráfico-plástica pura e simplesmente: ele busca adquirir novos hábitos representacionais, diferentes técnicas gráficas e conhecimentos artísticos profissionais. O grafismo deixa de ser uma atividade com fim em si mesma e converte-se em trabalho criador.

A estética do grafismo infantil
Uma vez apresentada a “etapização” do grafismo infantil segundo Vygotsky, passo a expor um panorama dos períodos que caracterizam o desenvolvimento do desenho como sistema de representação, do modo como julgo adequado à uma intervenção pedagógica tendo em vista a formação de professores para atuarem na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental:
(1) O rabisco descontrolado ou garatuja descontrolada - O rabisco descontrolado ou garatuja descontrolada caracteriza o período de desenvolvimento da coordenação motora fina necessária à manipulação objetal do marcador (lápis, caneta, pincel etc). As marcas gráfico-plásticas produzidas pelo sujeito sobre o suporte (p. ex: folha de papel, parede, chão) são muito mais o resultado do “exercício” da coordenação de ações motoras (praxias) absolutamente indispensáveis para o uso adequado de variadas ferramentas culturais. A produção gráfico-plástica da criança, nesta etapa, possui uma natureza muito mais expressiva do que semiótica ou simbólica (Figura 1). Ou seja: são as “descargas” motoras incontroladas que geram os rabiscos e “zigue-zagues” no suporte. Nesta fase, é apenas o acaso que leva o sujeito ao traçado, por exemplo, das formas circulares. Traçar um círculo ainda é uma tarefa de difícil solução para a criança neste momento. O destrismo (uso preferencial da mão direita) e o sinestrismo (uso preferencial da mão esquerda) ainda não podem ser claramente identificados. Verifica-se que as marcas geralmente ultrapassam os limites do suporte fornecido ao sujeito (o desenho extrapola as bordas da folha de papel). Observa-se também, em geral, que as marcas inscritas pelo sujeito em variados suportes, nesta fase, são “registradas” ali de tal modo que sugerem ter sido empregada ou muita “força” no traçado dos rabiscos ou, ao contrário, ter havido pouquíssima “pressão” com o marcador sobre o suporte. Costuma-se recomendar para uso das crianças, nesta etapa, marcadores resistentes tais como lápis de carpinteiro, giz de cera, canetas hidrográficas e/ou  pincéis grandes e grossos.

Garatuja descontrolada
                           
Figura 1                      
Garatuja descontrolada

(2) O rabisco controlado ou garatuja controlada - O rabisco controlado ou garatuja controlada caracteriza maior diferenciação entre as marcas produzidas no suporte por um mesmo sujeito. Constata-se que o “zigue-zague” incontrolado da etapa inicial cede lugar às formas circulares. Isto é: os traçados circulares - anteriormente frutos do acaso - agora são claramente intencionais. Nesta etapa, as formas circulares se repetem freqüentemente e vão sendo aperfeiçoadas com base nas praxias já adquiridas pela criança. Observa-se, neste momento, dois fenômenos muito curiosos: (1) a irradiação ou desenho de formas circulares ciliadas (Figura 3); e (2) uma espécie de proliferação de “círculos” justapostos de diversos tamanhos - como se houvesse a “produção em série” de muitas “bolinhas” (Figura 2). A criança demonstra com nitidez estar em um processo acelerado de aperfeiçoamento do traçado das formas circulares. Além disso, revela claramente já conseguir manter suas marcas dentro dos limites do suporte que lhe foi fornecido. Em outras palavras: o sujeito nos informa ter adquirido, nesta fase, um maior controle sobre os movimentos da mão. Neste período, as linhas “retas” (traços longos) se multiplicam e são aprimoradas pelo sujeito. Surgem os primeiros atos gráficos – a tentativa de representar deliberadamente objetos através do grafismo (Levin, 1998, p. 121). Nos primeiros atos gráficos tudo ocorre como se a intenção representacional primeira do sujeito fosse “traída” ao longo da execução das marcas – agora simbólicas – impressas no suporte. Isso acontece pela dificuldade que o sujeito ainda experimenta em coordenar as ações motoras complexas solicitadas no processo de representação gráfico-plástica dos objetos. Paralelamente, ao associar as marcas produzidas sobre o suporte a determinados objetos da realidade concreta, a criança começa a “dar nome” ao seu desenho (a dizer quais objetos seu desenho busca representar).

Garatuja controlada
Figura 2
Garatuja controlada

   Irradiação
Figura 3
Irradiação

(3) A representação gráfico-plástica pré-esquemática - A representação gráfico-plástica “pré-esquemática” equivale ao período denominado por Vygotsky de etapa simbólica (escalão de esquematismo) e caracteriza a fase em que não se observam formas gráficas invariantes para referir um determinado objeto (esquemas). Sol, nuvens e pássaros, por exemplo, não são representados do mesmo jeito ou por um único esquema gráfico (forma invariante) nos sucessivos e diferentes desenhos do sujeito.[3]
Verifica-se, nesta etapa, o fenômeno da justaposição (Figura 4), isto é, a colocação, lado a lado, de elementos que compõem o objeto representado pela criança sem, aparentemente, existir qualquer relação lógica entre eles. Na representação da figura humana, por exemplo, braços, cabelos, olhos e boca são desenhados ao lado ou “fora” do traçado do corpo. O grafismo até então ato impulsivo converte-se definitivamente em ato gráfico (Levin, 1998). O desenho, neste período, resulta de uma ação intencional do sujeito. Isto é: o desenho persegue claramente o objetivo de representar simbolicamente um determinado objeto. As marcas feitas pela criança sobre o suporte começam a ser planejadas com antecedência em sua mente - vale dizer, no plano intramental. Verifica-se que, nesta etapa, as praxias da criança já se encontram bastante desenvolvidas e consolidadas permitindo-lhe inclusive miniaturizar as marcas produzidas sobre o suporte. É a partir desta etapa que se pode iniciar o aprofundamento de estudos da expressão gráfico-plástica infantil ou expressão psicográfica do sujeito (Marin, 1985; Vygotsky, 1982). Através da análise do processo de produção gráfico-plástica do sujeito pode-se examinar, por exemplo, o modo como as crianças representam a realidade social e consegue-se até identificar estágios da construção pessoal da criança concernente à expressão político-ideológica de determinados temas em seus desenhos. Tais estudos costumam focalizar basicamente três aspectos da atividade representacional gráfico-plástica: (1) sua dimensão psicomotora; (2) sua dimensão estético-conceitual, ou seja, os princípios gráficos utilizados na construção dos objetos representados; (3) a dimensão gráfico-ideológica, quer dizer, o significado e sentido das comunicações através do grafismo (Marin, 1985, p.27).

Justaposição
       Figura 4
    Justaposição
           
(4) A representação gráfico-plástica esquemática - Este período equivale à etapa simbólico-formalista (escalão de formalismo e esquematismo) de Vygotsky. Nesta fase, observa-se a repetição de esquemas gráficos (formas gráfico-plásticas invariantes ou esterotipia) na representação de determinados objetos. A criança “descobre” uma solução gráfica para o desenho de alguns objetos (p. ex: o boneco “palito” para representar o ser humano; o telhado invariavelmente com chaminé para representar a cobertura das casas; a letra “v” para os pássaros etc).
Determinados esquemas gráficos inclusive podem ser compartilhados por mais de uma criança revelando a existência de uma autêntica cultura gráfica infantil (Figura 6). Neste caso, os sujeitos aprendem com os seus pares e com os membros mais experientes dessa “cultura gráfica infantil” muitos dos esquemas freqüentemente observáveis em seu grafismo. Mas, atenção: só se pode afirmar existirem esquemas gráficos comparando-se sucessivos desenhos de um mesmo sujeito ou os de determinado grupo de crianças.
 Evidentemente não se deve subestimar o poder auto-reprodutivo dessa cultura de esquemas nem tampouco a velocidade do seu movimento de expansão e hegemonia no mundo globalizado. A disseminação de esquemas gráficos nas sociedades letradas pós-modernas ocidentais pode apresentar-se, à primeira vista, como resultante de uma tendência universal ou “natural” dos seres humanos a um tipo muito preciso de prática gráfica, levando-nos a crer que a construção do sistema de representação do desenho pela criança é algo espontâneo, “inato” e “igual” para todos os sujeitos. Então, vale a pena lembrar que os esquemas são construtos histórico-culturais, ou seja, são artefatos “não-naturais”.
O psicólogo Karl Ratner explica muito bem esse fenômeno da “naturalização” de construtos histórico-culturais quando afirma que “a igualdade psicológica só existe na medida em que tenha a sustentação de semelhanças na vida social concreta. A universalidade sócio-psicológica não é um dado: ela tem que ser construída” (Destaques meus)(Ratner, 1995, p.119).
Ainda neste período verifica-se também o curioso fenômeno da transparência ou raio-x (o “desenho-radiográfico” ao qual se refere Vygotsky). Isto é: a revelação de objetos que não seriam visíveis a olho nu por trás de uma superfície opaca no desenho (p. ex: ao desenhar a fachada de uma casa a criança mostra os móveis e objetos que supostamente estariam em seu interior). Além da transparência (Figura 5) pode ocorrer ainda, nesta fase, um outro intrigante fenômeno: o rebatimento. O rebatimento é uma modalidade de representação do espaço tridimensional em que as indicações de profundidade e perspectiva encontram-se desenhadas num único plano (p. ex: ao desenhar uma estrada entre árvores a criança representa as árvores como se estivessem “deitadas” ao lado do caminho).
Neste período “esquemático” a lateralidade axial da criança é finalmente definida (seu “lado direito” e seu “lado esquerdo” se tornam evidentes) porque observa-se, agora, que a dominância lateral (destrismo ou sinestrismo) organiza o ato motor e as praxias (coordenação de ações físicas) do sujeito. Estabiliza-se enfim a prevalência manual da criança (recorrência de uso da mão esquerda ou direita).

Rebatimento e transparência
Figura 5
Rebatimento (à esquerda) e transparência (à direita)

Esquema gráfico para a representação de mãos e pés
Figura 6                                        
Esquema gráfico para a representação de mãos e pés
                                                                      

(5) A representação gráfico-plástica pós-esquemática -     Esse período equivale às etapas formalista veraz ou formalista verossímil e formalista plástica ou plástica propriamente dita de Vygotsky (escalão de representação mais aproximada do real e escalão da representação propriamente dita). A superação dos esquemas, comuns na fase anterior, só pode ocorrer se - e quando - o sujeito for submetido a uma intervenção pedagógica que o desafie a experimentar novas possibilidades para o tratamento gráfico-plástico de suas representações através do desenho. Geralmente constata-se uma tendência dos sujeitos em reproduzirem as convenções realistas-naturalistas na representação dos objetos neste período (modalidade dominante ou hegemônica de desenho). Pode surgir o interesse, nesta etapa, em conhecer e dominar as técnicas projetivas e euclidianas ou “clássicas” da representação gráfico-plástica do espaço.
As técnicas projetivas consistem em convenções que nos permitem visualmente diferenciar e coordenar nosso ponto de vista em relação aos objetos representados graficamente. Através delas pode-se “projetar” um objeto no espaço fornecendo-se a noção de primeiro e segundo planos além da impressão de profundidade (desenho em perspectiva).
Já as técnicas euclidianas são aquelas convenções que permitem organizar visualmente o desenho de modo tal que os objetos possam ser traçados considerando-se sua posição, distância e proporção em relação ao conjunto de referências espaciais que organizam e estabilizam a realidade graficamente representada.
As convenções projetivas e euclidianas são técnicas em geral muito utilizadas para criarem um efeito de “ilusionismo” e de “fidelidade” da coisa representada. O senso comum, por exemplo, costuma denominar por “desenho bem feito” as representações gráfico-plásticas que recorrem às técnicas projetivas e euclidianas.
Verifica-se também, neste período, a incorporação de um intrigante procedimento por parte dos sujeitos: o uso da linha de base. A linha de base é a definição - quase sempre explícita - da superfície geral na qual se apóia a “cena” mostrada pelo desenho (p. ex: ao representar uma casa, seus habitantes e arredores, o sujeito traça uma linha definindo a base sobre a qual serão apoiados os objetos e figuras do desenho).

Recursos pedagógicos para a coleta sistemática do grafismo infantil
Acredito ter exposto até aqui uma proposta terminológica adequada à compreensão histórico-cultural da “etapização” do grafismo infantil, relacionando-a à nomenclatura originalmente utilizada por Vygotsky. O leitor deve ter percebido que a nomenclatura apresentada busca atender às diretrizes formuladas pela teoria histórico-cultural da atividade-CHAT numa clara abordagem à expressão psicográfica da criança na perspectiva da psicologia sócio-histórica.
            Afinal cabe lembrar que o processo de apropriação e (co)laboração do desenho como sistema de representação semiótico pressupõe a intervenção deliberada do(a) professor(a) porque “não se trata de algo massificado, natural, espontâneo, ou seja, do surgimento por si mesmo da criação artística infantil, mas que esta criação depende da habilidade, de hábitos estéticos determinados, de dispor de materiais etc” (Vygotsky, 1982, p. 102). Além disso “no fomento da criação artística infantil, incluindo a representativa, será necessário estar atento ao princípio de liberdade, como premissa indispensável para toda atividade criadora” (Ibidem, p. 102).
            Com o que se disse acima coloca-se toda a complexidade da problemática subjacente ao gerenciamento das intervenções pedagógicas no âmbito do ensino das artes na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental: se por um lado é importante garantir a inventividade e liberdade de criação da criança, por outro, é necessário também assegurar-lhe a posse dos materiais, recursos e técnicas úteis ao pleno desenvolvimento de sua atividade criadora.
            No caso específico do processo de apropriação e (co)laboração do grafismo como sistema semiótico, fazer com que o sujeito venha a superar a fase esquemática solicita algum compromisso do(a) professor(a) para com a elaboração de uma ambiente de aprendizado rico, estimulante e desafiador.
Neste sentido, o paradigma metodológico triangular (Barbosa, 1996) pode ser um grande aliado do(a) professor(a) na melhoria da qualidade de suas intervenções pedagógicas com as Artes Visuais na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental (Deheizelin, 1998).
A “etapização” do grafismo infantil exposta aqui fornece um passeio rápido pelos principais períodos que caracterizam o desenvolvimento psicográfico da criança. A nomenclatura que refere cada uma das fases descritas me parece a mais apropriada para lidar com o relativismo estético pós-moderno na contemporaneidade.
Evidentemente a identificação e delimitação de períodos comuns ao processo de apropriação e (co)laboração do desenho como sistema de representação, por parte do(s) sujeito(s), não implica necessariamente compreender o “etapismo” ou “etapização” como “uma referência naturalizada da passagem do sujeito por um percurso universal abstrato” (Oliveira e outros, 2002, p. 44).
Examinando-se o ensaio psicológico de Vygotsky vê-se que ele recorre a desenhos de crianças com diferentes idades (7 a 10 anos) para discutir os típicos “desenhos-radiográficos” da etapa simbólico-formalista (Vygotsky, 1982, p. 95). E mais: que algumas legendas dos desenhos chegam a explicitar inclusive o capital cultural de seus autores: “não desenham em casa nem possuem livros com ilustrações”; “desenha em casa e possui livros com ilustrações” (Idem, p. 112 – 117).
A incorporação desse tipo de legenda aos desenhos demonstra haver uma clara tentativa de sinalizar a compreensão do “etapismo” como “uma referência historicizada da passagem por um percurso culturalmente contextualizado” (Oliveira e outros, 2002, p. 44).
Embora Vygotsky não explicite a adoção de um sistema “rizomático” para interrelacionar as diferentes dimensões (cognitiva, afetiva, psicomotora, histórica, social etc) enredadas na atividade do desenho, parece que ele advoga ali uma análise de dados menos “estruturalista” e menos “evolucionista” dos processos desenvolvimentais.
Um indício desse tipo de análise – “rizomática” ou “pós-estruturalista” - é a importância conferida por ele à articulação de diferentes níveis genéticos (filogenético, macrogenético e ontogenético) em sua abordagem à constituição social do psiquismo humano – se bem que não se pode negar que Vygotsky tece, muitas vezes, uma argumentação ambígua em torno da idéia de desenvolvimento (Vygotsky&Luria, 1996).
Mas o desenvolvimento, na perspectiva histórico-cultural, deve ser pensado como o conjunto dos processos de transformação que ocorrem ao longo da vida do sujeito - e que se relacionam “tanto a fenômenos orgânicos, maturacionais, que permitem asserções universalizantes sobre certos aspectos do desenvolvimento (especialmente nas menores idades), como a processos enraizados historicamente, que requerem uma contextualização histórico-cultural para serem adequadamente compreendidos” (Oliveira e outros, 2002, p. 43). Desse ponto de vista, a abordagem desenvolvimental ou evolutiva diverge muito do modo “desenvolvimentista” ou “evolucionista” de aproximação de um objeto.
Se o(a) professor(a) estiver atento às produções gráfico-plásticas dos seus alunos ele(a) poderá acompanhar os ritmos pessoais de cada criança e identificar eventuais fases comuns à toda sua turma de educandos. Mas, não basta entender os mecanismos psicomotores, cognitivos, afetivos e histórico-culturais enredados no grafismo infantil. É preciso oferecer um ambiente de aprendizado desafiador e estimulante aos alunos que busque: (1) valorizar sua expressão psicográfica; e (2) promover avanços nos processos singulares de apropriação e (co)laboração do sistema de representação do desenho.
Adiante passo a expor alguns instrumentos pedagógicos úteis nesse sentido. Porém, inicialmente, é necessário fazer uma distinção muito grosseira entre desenho e pintura. Embora rude, a diferenciação será útil para esclarecer a especificidade estética dessas duas modalidades de expressão gráfico-plástica bidimensional. Evidentemente o conceito de desenho pode ser ampliado - e as fronteiras entre desenho, pintura e escultura se tornarem pouco nítidas. Não cabe aqui uma discussão conceitual a esse respeito.
No desenho, pode-se dizer, o sujeito deixará sempre o suporte - ou parte dele (papel, tela etc) - à mostra do observador. Ou seja: as marcas impressas em um determinado suporte não ocupam nem preenchem toda a extensão de sua superfície. Já na pintura, ao contrário, toda a superfície do suporte é recoberta por tratamento plástico. Atenção: deste ponto de vista desenho colorido ou colorizado não é pintura!
            Tanto o desenho como a pintura são representações gráfico-plásticas bidimensionais, isto é, buscam correlacionar duas dimensões do objeto representado: a altura e a largura das formas. Embora nos desenhos e pinturas as formas representadas simulem possuir expessura e volume, elas – a representação propriamente dita dessas formas - não são tridimensionais. Falta-lhes a terceira dimensão, o volume. Desenhar e pintar em perspectiva uma caixa, por exemplo, difere muito de representá-la, moldá-la ou esculpi-la em três dimensões. Todavia na escultura a altura, largura e volume das formas são dados palpáveis, concretos. A escultura é uma representação gráfico-plástica tridimensional.
            Os instrumentos pedagógicos de coleta do grafismo relacionados a seguir aplicam-se indistintamente às representações bi e tridimensionais das crianças, isto é, aos seus desenhos e pinturas (representações plásticas bidimensionais) e esculturas (representações plásticas tridimensionais).
(1) O desenho espontâneo - [Leia-se pintura espontânea, escultura espontânea]. É o desenho onde não existe uma proposta temática por parte do(a) professor(a). A criança busca desenhar o que quer e o que lhe é significativo em um dado momento.
(2) O desenho da história  - [Leia-se pintura da história, escultura da história]. O(a) professor(a) lê, conta ou apresenta através de vídeo, teatro de sombras ou de fantoches, por exemplo, uma história para as crianças. Em seguida, propõe que os alunos desenhem “de cabeça” ou “de memória” (sem uso de modelos para cópia) a história que lhes foi apresentada.
     (3) A história do desenho - [Leia-se história da pintura, história da escultura]. O(a) professor(a), após a atividade de desenho espontâneo do aluno, solicita-lhe que este fale e conte a história do seu desenho.
     (4) O desenho de vivência - [Leia-se pintura de vivência, escultura de vivência]. O(a) professor(a), após uma determinada vivência do grupo (excursão ao zoológico, ida ao teatro, por exemplo) solicita aos alunos o registro gráfico-plástico daquela experiência.
(5) O desenho de observação - [Leia-se pintura de observação, escultura de observação]. O(a) professor(a) apresenta um determinado objeto ou imagem à turma e, em seguida, solicita aos escolares que desenhem o que lhes é colocado à mostra (cópia do modelo).
     (6) O desenho a partir de interferência “sobre” o suporte - [Leia-se pintura a partir de interferência sobre o suporte, escultura a partir de interferência sobre o material a ser moldado]. O(a) professor(a) apresenta ao grupo suportes com uma determinada interferência gráfico-plastica (contendo parte de uma imagem recortada de revista, por exemplo) e, a seguir, solicita aos escolares que completem, desenhando, o fragmento de ilustração colada sobre o suporte.
(7) O desenho a partir de interferência “no” suporte - [Leia-se pintura a partir de interferência no suporte]. O(a) professor(a) oferece à turma suportes em formatos variados (suporte em forma de círculo, de estrela etc) e, a seguir, pede aos escolares que façam um desenho espontâneo sobre eles.
      (8) O desenho a partir da “reunião de partes” - [Leia-se pintura a partir da “reunião de partes”, escultura a partir da “reunião de partes”]. O(a) professor(a) oferece aos alunos envelopes grandes contendo variadas formas recortadas em cores e tamanhos diversos (não apenas formas geométricas). A seguir, pede aos escolares que elaborem com elas uma composição gráfico-plástica utilizando as formas disponibilizadas nos envelopes sobre um determinado suporte (pode ser desenho espontâneo, desenho de vivência, da história etc). Feita a composição, o(a) professor(a) pode solicitar ao aluno que, sobre um novo suporte, desenhe, pinte ou esculpa a composição elaborada com as “partes” (desenho de observação – neste caso, do próprio desenho do sujeito). Observação: as composições com as formas podem ser feitas solitariamente ou em grupo (duplas, trios etc). Os desenhos de observação da composição no entanto precisam ser individuais. Pode-se propor a composição de formas no computador a partir de softwares gráficos (o programa paint, por exemplo). Mas o desenho de observação neste caso deve ser necessariamente feito do modo tradicional (manualmente).
(9) O diálogo gráfico – [Leia-se diálogo plástico no caso de se solicitar pintura ou escultura ao aluno]. O(a) professor(a) propõe que uma dupla de alunos, por exemplo, faça um desenho [pintura ou escultura] em conjunto, de maneira que os escolares se revezem, em turnos, na produção gráfico-plástica conjunta.
      (10) O desenho de memória  - [Leia-se pintura de memória, escultura de memória]. O(a) professor(a) propõe um “jogo” no qual ele(a), professor(a), irá pedir aos escolares que desenhem “de memória” determinados objetos ou cenas que serão revelados a todo o grupo (uma espécie de “ditado” gráfico-plástico).
Acredito que as dez propostas para a atividade gráfico-plástica relacionadas e descritas acima são suficientes para animar uma série de intervenções pedagógicas do(a) professor(a) na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental. Não se quer dizer com isso que as propostas para atividade com as Artes Visuais na escolarização devam se restringir apenas a elas. Mas, sem dúvida, as propostas apresentadas aqui constituem um importante conjunto de ferramentas pedagógicas úteis na coleta da expressão psicográfica da criança. Costuma-se porém adotar alguns procedimentos para a catalogação e o arquivo sistemático da produção gráfico-plástica do aluno:
(1) A primeira coisa a fazer é confeccionar portfólios (envelopes grandes para a guarda dos desenhos e pinturas de cada aluno). Costuma-se propor aos próprios alunos a confecção dos seus respectivos portfólios. Embora eles possam ser adquiridos já prontos em papelarias pode ser mais barato confeccioná-los, por exemplo, a partir da junção de duas folhas de cartolina unidas por fita adesiva ao longo de três das suas extremidades. Em apenas uma das folhas de cartolina - ou em cada uma delas - poderá ter sido solicitado, anteriormente, um desenho ou pintura da criança. As folhas devem ser unidas com as faces nas quais se encontram os desenhos ou pinturas voltadas para o exterior, claro. Toda a produção gráfico-plástica do aluno ao longo do ano deve ser arquivada em seu portfolio pessoal. Isso permitirá o acompanhamento longitudinal dos avanços, recuos e aspectos gráficos da expressão psicográfica do pré-escolar ou escolar.
(2) Além do portfolio alguns hábitos precisam ser rotinizados por parte do(a) professor(a). O mais importante deles é, sempre, providenciar a identificação dos autores dos desenhos na face do suporte que não foi utilizada pelo sujeito (“atrás” do desenho). A identificação deve revelar o nome do aluno, sua idade, a data da confecção do desenho e o tipo de atividade que lhe foi proposta. Exemplo: Bruna, 5 anos, 08 de maio de 2004, desenho espontâneo. Isso facilitará a avaliação por parte do(a) professor(a) da trajetória única, pessoal e insubstituível da criança em seus movimentos de apropriação e (co)laboração do desenho como sistema semiótico. Pais e pesquisadores do grafismo infantil no entanto podem ser mais precisos na identificação do tempo de vida da criança. Neste caso, costuma-se revelar não apenas quantos anos a criança tem mas, também, informar a quantidade de meses e dias de existência do sujeito. Exemplo: Luis, 1;6 (30). Neste tipo de notação o pesquisador, professor(a) ou pai registra a quantidade de anos (um), de meses (seis) e dias (trinta) que o sujeito tem de vida. Observe que após o nome da criança coloca-se uma vírgula, para logo depois ser informado o número que corresponde à quantidade de anos que ela possui. Em seguida, separado por um ponto e vírgula, informa-se a quantidade de meses de vida do sujeito. Por fim, entre parênteses, registra-se com precisão os dias de vida da criança (Piaget, 1978).

Considerações finais
Espero aqui ter compartilhado com você, leitor, alguns conhecimentos teórico-práticos que me parecem indispensáveis à implementação de intervenções pedagógicas tendo em vista a apropriação e a (co)laboração do desenho enquanto sistema de representação por parte do educando.
A discussão sobre a quem cabe a responsabilidade do ensino das artes na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental continua. Na introdução ao artigo eu já me posicionei claramente em relação à essa problemática. E minha opinião – já disse - é a de que esta é uma prerrogativa do pedagogo, ou seja, do profissional da educação - (in)formado e licenciado para exercer o magistério nestes níveis iniciais da escolarização.
Mas isso não significa excluir definitivamente a possibilidade de o licenciado para o ensino das diferentes linguagens artísticas (Artes Visuais, Dança, Música e Teatro), do artista e do arte-educador autodidata atuarem junto aos profissionais da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental (recentemente, por exemplo, a Prefeitura de São Paulo fez concurso público para o ensino de artes nos CEUs abrindo inscrições para licenciados em arte, artistas e arte-educadores autodidatas). Mas – é claro - o professor de arte, o arte-educador e o artista autodidata, neste caso, necessitam obter (in)formações adequadas para gerenciarem competentemente suas intervenções pedagógicas nestes níveis da escolarização.
A principal questão continua sendo a da (re)conceptualização dos processos (in)formativos dos profissionais da educação na perspectiva da melhoria da qualidade da educação que é oferecida no país.
Penso que, paralelamente à tradicional ênfase no saber (conhecimento), as universidades e agências (in)formadoras do(a) professor(a) devem cuidar também para que o saber-fazer (transposição didática do conhecimento) e o ser (militância pedagógica e exercício consciente da profissão docente) recebam a mesma atenção por parte dos propositores das matrizes curriculares dos cursos para a formação de professores.
Mas não se pode jamais esquecer que “a escola é sempre construção dos sujeitos sociais, que se apropriam de determinado modo da escola e das determinações sociais e estatais a partir das suas histórias particulares, e de suas experiências” (Sawaya, 2002, p. 205). Então não sejamos ingênuos: a melhoria da qualidade da educação nacional requer a melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro como um todo!
Mas daí a cruzar os braços em sala de aula e esperar a coisa ser resolvida ao nível das macropolíticas educacionais é, no mínimo, no meu entendimento, falta de compromisso para com os interesses das classes sociais mais débeis, fragilizadas e alijadas do mundo do conhecimento. Equivaleria aliená-las do direito universal à uma escolarização digna.
Hoje, estou convencido de que são sobretudo as micropolíticas na esfera do cotidiano profissional do(a) professor(a) (de sua prática docente em sala de aula) que fundamentalmente (re)dimensionam o poder revolucionário da educação.


Referências bibliográficas

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[1] Doutor em Educação e mestre em Artes pela USP; licenciado e bacharel em Teatro pela UFBa. End. para correspondência: Rua Enseada do Cavaco, 66 – Barra Grande, Vera Cruz,  Cep. 44 470000, Bahia. Fone: (71) 636 8627.
y VYGOTSKY, L. S. (1982). La imaginación y el arte em la infância – ensayo psicológico. Madrid: Akal, p. 106.
[2] O uso da palavra esquema por Lowenfeld&Brittain difere do uso que Vygotsky faz deste vocábulo em sua proposta terminológica para a caracterização das etapas do grafismo infantil. Adoto o conceito de esquema de Lowenfeld&Brittain como ponto de partida para propor a nomenclatura que apresento aqui.

[3] O conceito referido por esquema (esquema gráfico, forma gráfica invariante), na nomenclatura de Lowenfeld&Brittain, difere do sentido desta palavra na expressão escalão de esquemas utilizada por Vygotsky. O escalão de esquemas vygotskiano equivale ao que Lowenfeld&Brittain chamam de etapa pré-esquemática. Por isso optei por utilizar a expressão etapa simbólica na tradução da nomenclatura formulada por Vygotsky.



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EIS AÍ UMA GRANDE OPORTUNIDADE: “O QUE PASSOU, PASSOU”! Por Fabio Campos




EIS AÍ UMA GRANDE OPORTUNIDADE: “O QUE PASSOU, PASSOU”!

Por Fabio Campos

Quem nunca desejou um recomeço diante das colheitas desastrosas? Quem nunca desejou fazer tudo diferente? A nostalgia nem sempre é ruim! As lembranças podem trazer esperança! A frase tola “não me arrependo de nada”, de fato, denuncia um orgulho e uma arrogância em reconhecer que precisa mudar [mesmo sabendo desta verdade].

O Evangelho do Reino de Deus traz uma excelente notícia! Uma “boa-nova” é colocada diante dos pobres de espírito e dos fracassados [moralmente] aos olhos do mundo. A Escritura diz que “antes de tudo”, o Filho Jesus, habitava com o Pai (Jo 1.1). Assim como há um Deus em três pessoas [Pai, Filho e Espírito Santo], o Deus-Filho, Sempre foi com o Deus-Pai. O nome “Jesus” é pregado por diversas religiões. Contudo, O Filho de Deus, não é um espírito evoluído como ensina o Kardecismo; nem um ser criado ou um “deus” menor como ensina as Testemunhas de Jeová; Ele também não é o irmão mais velho de satanás como ensina o mormonismo; nem um profeta lunático como denuncia o judaísmo. Não! Você pode conhecer todas as histórias a respeito de Jesus. Mas somente o Espírito Santo poderá revelar quem Ele é de fato, “o Cristo! Filho do Deus Vivo” (Mt 16. 13-26)!

Somente o Espírito Santo pode testificar em nosso espírito acerca desta paternidade, a qual nos outorgou pela adoção. Ninguém jamais viu a Deus a não ser o unigênito do Pai. O Cordeiro de Deus, o único que pode tirar o pecado do mundo, se ofereceu e deu sua vida em resgate de muitos. Deus abriu a porta da salvação - em Cristo, os homens, pela fé, podem se achegar a Ele sem o temor [medo].

Todos os seres humanos são indesculpáveis diante de Deus (Rm 1.20). Não há um justo sequer (Rm 3.10). Um juiz nunca irá mudar a lei de acordo com o que o réu acredita. A relativização das leis divinas é o método de persuasão que os homens usam para enganar a si mesmos e dar conforto a sua consciência que o acusa de dia e de noite a respeito do pecado, da justiça e do juízo. Se não há um absoluto, por que então, não relativizamos a morte? Por que, então, não dizemos a si mesmos: “não precisamos comer nem beber”, pois a fome e a sede são relativas? Se há um Criador e assim Ele fez as ordens naturais que são imutáveis [o nascer do sol nunca poderá ser relativizado], por que, então, Ele iria relativizar a condição de salvação do homem parametrizando-a de acordo com o que cada um acredita? Pela sua persuasão você pode enganar a si mesmo e aos homens ao seu redor, mas não poderá “dobrar” a Deus e nem fazer com que Ele mude os seus decretos eternos.

Todos são desobedientes e desviados desde o ventre (Sl 51.5; 58.3). Os mais desobedientes são aqueles que acham que merece alguma coisa de Deus. O mundo anda segundo suas inclinações, satisfazendo os desejos de suas paixões. Sem Cristo somos filhos da ira (Ef. 2.3). Você pode não acreditar e zombar desta palavra, se apegando aos preceitos e ritos de sua religião-, contudo, a verdade não é relativa, pois se assim fosse, não seria verdade. Uma hora a fatura vai chegar; o salário do pecado é a morte. Nisto o Senhor alerta: “O que adiantou ganhar o mundo, satisfazer suas paixões pecaminosas, e ter perdido a alma”? Um dia você terá que prestar contas da sua vida – quer você acredite – quer não!

Um noticia ou talvez um lembrete: “Você vai morrer”! Quem poderá te salvar? Será que Deus se submeterá aos preceitos dos homens dispensando aqueles que foram determinados por sua Eterna Sabedoria? Você nunca parou para pensar? imagine se a Bíblia for a verdade de Deus?  A Escritura é totalmente intolerante concernente ao meio pelo qual os homens devam ser salvos: “E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos” (At 4.12).

Você assim como eu, é um pecador! Contudo, Deus é rico em misericórdia! Ela só poder ser dada em vida. Não espere provar do inferno para entender tal verdade. Não importa o que você seja agora: impuro, idólatra, adultero, homossexual, ladrão, avarento, bêbado, maldizente ou ladrão (1 Co 6.9-10)-, pela misericórdia, se em vida, você se arrepender e colocar sua fé em Jesus, você será salvo (At 2.21). Isso não vem pelas obras, mas é dom gratuito de Deus, para que, no grande dia, ninguém diga: “o mérito foi meu” (Ef. 2.8-9).

O que impede aos homens de se achegarem a Cristo é a dureza do vosso coração (At 7.51) e o amor pelo pecado - o que será usado no julgamento contra todo aquele que ama mais si do que a Deus: “O julgamento é este: que a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz; porque as suas obras eram más” (Jo 3.19 RA). Colocam empecilhos dizendo, “mas não vou poder fazer isso ou aquilo”. Isso demonstra que você nunca poderá dizer o primeiro e maior mandamento de todos: “Amo a Deus acima de todas as coisas” (Mt 22.37). O seu pecado é seu ídolo. Esse pecado está acabando com você. Perceba quantos malefícios ele te trouxe.

Há uma oportunidade, pois Deus amou o mundo de tal maneira que entregou seu único filho para que todo o que nEle crer, não pereça, mas tenha vida eterna (Jo 3.16). Pela fé, Cristo pode habitar no seu coração (Ef 3.17), trazendo-lhe paz e alegria no Espírito Santo (Rm 14.17) – o reconciliando com Deus e tornando-o amigo do Senhor ao invés de “filho da ira”. A graça de Deus está disponível a você. O favor de Deus pode te alcançar pela misericórdia. Se ouvires a voz de Deus não endureçais o coração, pois o Senhor tem prazer no perdão (Mq 7.18).

Em Cristo Deus lhe dirá: “O que passou, passou”! Sua ficha foi limpa com o Sangue do Meu Filho e a sua conta foi paga na Cruz do Calvário (Cl 2.13-15). Não haverá necessidade de purgatório, de reencarnação, nem de sacrifícios ascéticos; também não precisará dar dinheiro para comprar um terreno nos Céus; nem fazer qualquer rito - seja cura interior, seja regressão; nem ao menos quebrar as “possíveis maldições” do passado, pois disto as Escrituras ratificam e sela com a Verdade:

“E assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; as COISAS ANTIGAS SE PASSARAM; eis que se FIZERAM NOVAS”. - 2 Co. 5.17 R.A

Esta é a promessa de Deus em Cristo para você: “O que passou, passou!”

Soli Deo Gloria!

Fabio Campos




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terça-feira, 6 de maio de 2014

GOVERNOS X SOCIEDADE LIVRE - LIBERDADE É UMA JÓIA RARA QUE PRECISAMOS VA...



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Compreendendo Montessori: O Material Montessoriano



Compreendendo Montessori: O Material Montessoriano

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Este texto é o segundo da série “Compreendendo Montessori” e tratará do material montessoriano. Nosso primeiro texto, nesta série, foi sobre o desenvolvimento neuronal da criança pela perspectiva montessoriana.
O Material Montessoriano
E.M. Standing foi amigo e admirador de Maria Montessori. EscreveuMaria Montessori: Her Life and WorkNeste livro, inicia sua explicação sobre o trabalho da criança dizendo  que o objetivo de seus esforços é interno, diferente do que ocorre com o adulto. Para clarear esta explicação, uma metáfora é interessante. Se, vendo um homem encher um carrinho com areia de praia, nós nos oferecêssemos para fazê-lo em seu lugar, ele 
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prontamente aceitaria. No entanto, se fizéssemos o mesmo com uma criança que enche seu baldinho de areia, ela nos negaria veementemente e, não só continuaria o trabalho como o repetiria vezes sem conta. 
Isto ocorre porque o adulto deseja transportar a areia para algum lugar. O mais importante para o adulto é o objetivo final. A criança deseja exercitar-se, aprender, viver a experiência e sentí-la de todas as maneiras. A experiência da criança precisa ser respeitada, havendo a menor quantidade possível de interferências adultas e respeito pelo tempo necessário a cada uma para desenvolver e repetir uma atividade quantas vezes quiser.
O método Montessori tem como pressuposto a liberdade. Para que esta liberdade seja proveitosa, no entanto, o ambiente deve ser preparado. “O primeiro objetivo do ambiente preparado é tornar a criança independente do adulto”, diz Standing. A relação que se estabelece, então, é não só do professor com a criança, mas da criança com o professor e com o ambiente. Este ambiente deve ser completamente adaptado aos pequenos, em tamanho e em utilidade, e deve conter os materiais necessários a alguns tipos de desenvolvimento:
  • Vida Prática;
  • Educação dos Sentidos
  • Aquisição de Cultura
  • Outros aprendizados necessários à faixa etária.
As atividades de vida prática visam auxiliar o desenvolvimento do controle motor e das habilidades necessárias para o dia-a-dia. Os principais objetivos desta área, segundo McNichols, são o “cuidar do ambiente”, o “cuidar de si mesmo”, “habilidades úteis para a vida” e “graça e cortesia”. Não há uma seleção fixa de materiais para a vida prática, já que a depender da época e do local, as habilidades a desenvolver podem mudar muito. Entre as mais comuns no Brasil estão as habilidades ligadas à autonomia para se vestir e servir-se na cozinha, assim como o aprendizado de formas de limpar e organizar ambientes.
003424Para a educação dos sentidos, a seleção de materiais é mais tradicional, embora possa contar com inovações dos professores. Para esta área, há dezenas de materiais que procuram educar sentidos específicos, como o da percepção de cor, peso, tamanho, textura, cheiro ou som. Montessori acreditava que antes de se iniciar qualquer trabalho puramente intelectual, os sentidos deveriam estar plenamente desenvolvidos.
É interessante notar que embora os alunos aprendam as características sensoriais com materiais específicos, a aplicação destes conceitos ao mundo real acontece espontaneamente, sem a necessária interferência de um professor em outro momento que não seja a lição inicial sobre como utilizar o material.
Montessori percebeu logo que a aquisição de cultura pode começar cedo, já que o interesse das crianças pelos números e pela escrita, especialmente, é flagrante em todos os locais do mundo e, até onde se sabe, em todas as épocas. Um bom exemplo de como funciona a dependência entre os materiais é a preparação para a escrita.
O desenvolvimento desta habilidade é longo e começa nos primeiros materiais da área sensorial. A delicadeza necessária para segurar um lápis, o controle da pressão sobre o papel, o formato de cada letra e seu som e a habilidade de traçar linhas são competências trabalhadas por muito tempo antes que o aluno, de fato, escreva. Muitas vezes, a criança tem a impressão de ter aprendido a escrever sozinha, já que após conhecer os sons das letras e adquirir as técnicas necessárias, escreve “de repente”, sem receber ordens e por livre e espontânea vontade.
Outros materiais trabalham a cultura como a concebem os adultos: Ciências, História e Geografia. Estes variam completamente a depender do grupo social dentro do qual se insere a escola. No entanto, alguns padrões são obedecidos, já que alguns tipos de habilidades são especialmente agradáveis para a criança: classificação, pareamento, organização e nomeação são algumas delas.
Abaixo, vamos trabalhar algumas das características gerais dos materiais Montessori.
Características dos materiais:
A principal característica dos materiais montessorianos em uma sala preparada é que sirvam à manipulação do aluno sempre. Em uma sala comum, um globo terrestre pode ser utilizado pelo professor à frente da turma. Em um ambiente Montessori, há globos terrestres com diferentes destaques e que devem ser utilizados para vários fins pelos próprios alunos.
Outra característica muito relevante dos materiais é que contém em si o que chamamos de “controle do erro”. O aluno deve poder perceber sozinho, em todos os materiais, quando acertou e quando errou. Como exemplo, temos os cilindros de madeira:
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O aluno deve encaixar todos os cilindros no bloco. Cada um dos cilindros só cabe adequadamente em um orifício da madeira. Se um dos cilíndros for colocado no local errado, será impossível terminar o exercício. Assim, não é necessário que o professor corrija a atividade, já que esta corrige a si mesma, e o aluno percebe seu erro sem nenhuma interferência externa.
O controle do erro nos materiais permite também ao professor uma liberdade muito maior, para que ele possa auxiliar outras crianças, ensinar a se utilizar um ou outro material, corrigir alguma atividade nociva ao ambiente ou às crianças e – sua tarefa mais importante – observar a sala e o desenvolvimento de cada aluno. No entanto, longe de diminuir as responsabilidades do professor, que perde muito da função de ensinar e corrigir, o material didático montessoriano confere muitas outras responsabilidades a ele, pois só sem estar ativamente ensinando o tempo todo o professor pode realmente perceber se os alunos estão aprendendo.
A terceira importante característica dos materiais Montessori é o “isolamento da dificuldade”. Normalmente, para ensinar a cor vermelha, por exemplo, o professor falaria sobre morangos, cerejas e flores, fazendo com que o aluno tivesse de associar muitas palavras e muitas coisas antes de compreender o vermelho. O material para cores de Montessori é uma caixa com pequenos tabletes coloridos.
Os tabletes de cores são todos iguais em textura, forma, tamanho e peso. A única diferença entre eles é a cor, de maneira que o aluno possa associar diretamente o conceito à realidade que ele representa.
A Lição em Três Tempos:
Para ensinar a utilização dos materiais às crianças, o professor não dá uma aula geral e nem insiste muitas vezes. Ele pega o material, coloca-o diante do aluno e demonstra, com poucas palavras e instruções precisas, passo-a-passo, como se desenvolve a atividade.
Muitos dos materiais trabalham com a associação entre conceitos e coisas. Para se ensinar estes conceitos pela primeira vez, utiliza-se a Lição em Três Tempos. Incialmente se mostra os dois objetos e se nomeia a ambos: “Isto é uma colher, isto é um garfo”. Em seguida, pede-se que o aluno aponte, pegue ou mova “a colher”, ou “o garfo”. Depois de algumas variações desta segunda parte, pergunta-se ao aluno “Qual é este?” e “Qual é este?”, apontando-se uma vez a cada objeto. Assim, na primeira etapa nomeia-se algo, transmite-se uma informação. Na segunda, associa-se o nome ao objeto de fato, por meio do movimento, principalmente. No terceiro tempo, testa-se o aprendizado da criança, para que saibamos se a lição foi cumprida. Usa-se poucas palavras, para não confundir a criança, e para que ela possa, a partir deste momento, exercitar-se livremente, sem precisar ficar presa ao adulto por muito tempo.
O objetivo desta explicação foi somente esclarecer que, de todas as personagens da sala montessoriana, a principal é a criança e o primeiro coadjuvante é o material. É por meio da interação entre estas duas personagens que tudo acontece. A função do professor, neste contexto, é fazer com que tudo flua da melhor forma possível, especialmente evitando atrapalhar com interrupções excessivas. O adulto, neste palco, é o contra-regra, que entra quando é necessário e sai quando tudo está pronto. Somente por meio de seu bom trabalho tudo funciona, mas sua importância não é a de quem recebe o foco da iluminação, é a de quem garante que a lâmpada vai acender.
Até mais!
Bibliografia:
McNICHOLS, J.C. – The Montessori Controversy. New York: Delmar Cengage Learning, 1998
STANDING, E.M. – Maria Montessori: Her Life and Work. New York: New American Library, 1962.
MONTESSORI, M. – Dr. Montessori’s Own Handbook. New York: Frederick A. Stokes Company, 1914.

http://larmontessori.com/2013/01/22/compreendendo-montessori-o-material-montessoriano/


O Método

O que é o Método Montessori
Método Montessori é o nome que se dá ao conjunto de teorias, práticas e materiais didáticos criado ou idealizado inicialmente por Maria Montessori. O método Montessori é constituído por quatro pilares: um deles é uma forma de enxergar o desenvolvimento da criança, e os outros três são pontos de vista sobre a educação como um auxílio à vida da criança em desenvolvimento.
De acordo com Maria Montessori, o ponto mais importante do método é, não tanto seu material ou sua prática, mas a possibilidade criada pela utilização dele de se libertar a verdadeira natureza do indivíduo, para que esta possa ser observada, compreendida, e para que a educação se desenvolva com base na evolução da criança, e não o contrário.
Montessori escreveu que o desenvolvimento se dá em “períodos sensíveis”, de forma que em cada época da vida predominam certas características e sensibilidades específicas. Sem deixar de considerar o que há de individual em cada criança, Montessori pode traçar perfis gerais de comportamento e de possibilidades de aprendizado para cada faixa etária, com base em anos de observação.
A compreensão mais completa do desenvolvimento permite a utilização dos recursos mais adequados a cada fase e, claro, a cada criança em seu momento, já que as fases não são estanques e nem têm datas exatas para começar e terminar.
Assim, os seis pilares educacionais de Montessori são:
  1. Autoeducação
  2. Conhecimento como ciência
  3. Educação Cósmica
  4. Ambiente Preparado
  5. Adulto Preparado
  6. Criança Equilibrada
Autoeducação é a capacidade inata da criança para aprender. Por desejar absorver todo o mundo à sua volta e compreendê-lo, a criança o explora, investiga e pesquisa. O método Montessori proporciona o ambiente adequado e os materiais mais interessantes para que a criança possa se desenvolver por seus próprios esforços, no seu ritmo e seguindo seus interesses.
Educação Cósmica é a melhor forma de auxiliar a criança a compreender o mundo. De acordo com este princípio, o educador deve levar o conhecimento à criança de forma organizada – cosmos significa ordem, em oposição a caos -, estimulando sua imaginação e evidenciando que tudo no universo tem sua tarefa e que o ser humano deve ser consciente de seu papel na manutenção e melhora do mundo.
Educação como Ciência é a maneira de compreender a criança e o fenômeno educativo de acordo com Montessori, e defendida pela ciência de hoje. Em Montessori, o professor utiliza o método científico de observações, hipóteses e teorias para entender a melhor forma de ensinar cada criança e para verificar a eficácia de seu trabalho no dia a dia.
Ambiente Preparado é o local onde a criança desenvolve sua autonomia e compreende sua liberdade em escolas e lares montessorianos. O ambiente preparado é construído para a criança, atendendo às suas necessidades biológicas e psicológicas. Em ambientes preparados encontram-se mobília de tamanho adequado e materiais de desenvolvimento para a livre utilização da criança.
Adulto Preparado é o nome que damos, em Montessori, para o profissional que auxilia a criança em seu desenvolvimento completo. Esse adulto deve conhecer cientificamente as fases do desenvolvimento infantil e, por meio da observação e do domínio de ferramentas educativas de eficiência comprovada, guiar a criança em seu desabrochar, de forma que este se dê nas melhores condições possíveis.
Criança Equilibrada é qualquer criança em seu desenvolvimento natural. Por meio da. utilização correta do ambiente e da ajuda do adulto preparado, as crianças expressam características que lhes são inatas. Entre outras, encontram-se o amor pelo silêncio, pelo trabalho e pela ordem. Todas as crianças nascem com estas características e as desenvolvem melhor entre zero e seis anos.
Todos os princípios do método Montessori devem funcionar em união, para que a criança se desenvolva de forma completa e equilibrada. É necessário compreender a criança para identificar nela os sinais da eficiência daquilo que lhe está sendo oferecido. De acordo com Montessori, “uma das provas da correção do processo educacional é a felicidade da criança”.
O método Montessori tem sido utilizado em escolas por todo o mundo, desde o berçário até o Ensino Médio. Além disso, aplica-se Montessori em escolas especiais, clínicas de psicopedagogia e lares mundo afora. Clínicas de repouso aproveitam características do método montessoriano para o tratamento de demência e Alzheimer e iniciativas empresariais aplicam princípios do método para o melhor desenvolvimento de seus negócios.
Algumas das maiores personalidades do mundo moderno foram educacadas em Montessori. Entre eles, estão os fundadores da Google, e Andrew McAfee, colunista da Harvard Business Review.
Sergey Brin (co-fundador do Google):
“Cheguei no país com seis anos e imediatamente fui para uma escola Montessori. [...] Eu realmente acho que me beneficiei da educação Montessori, que de algumas maneiras dá aos alunos muito mais liberdade para fazer as coisas do seu jeito, e para descobrir. Interessante que meu parceiro Larry Page também tenha ido a um jardim de infância e pré-escola Montessori; é algo que temos em comum. Eu acho mesmo que algum crédito da vontade de ir atrás de seus interesses… você pode ligar isso àquela educação Montessori”.
Andrew McAfee (Colunista da Harvard Business Review e pesquisador do MIT):
“Estou muito contente de saber que o método Montessori está começando a ser utilizado em escolas públicas [nos Estados Unidos]. E estou ansioso por mais pesquisas sobre as vantagens e desvantagens desta abordagem educacional. Até que me convençam do contrário, continuarei a acreditar em Montessori e a recomendá-lo para os pais”.
Você encontra abaixo vídeos com trechos do texto acima e com explicações sobre o método Montessori. O compartilhamento é livre e desejável, mas agradecemos por você não editar os vídeos de nenhuma maneira.





http://larmontessori.com/o-metodo/


Conferências

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domingo, 4 de maio de 2014

PNE: autismo ideológico da pedagogia confunde superdotado com deficiente mental ESCRITO POR JOSÉ MARIA E SILVA


 Fanatizada pela igualdade e inimiga do mérito, universidade declara guerra à inteligência e pretende aprisionar nas falidas escolas públicas o aluno superdotado — que corre o risco de ser proibido de frequentar escolas privadas de elite
Einstein, de fato, teve problemas na escola devido ao seu gênio irascível, mas estava longe de ser outro “superdotado deficiente”, nos moldes prescritos pelo nosso MEC.

Se o seu filho aprendeu a tocar violino aos cinco anos, era o primeiro aluno da classe aos sete anos, resolvia sozinho complicados problemas de matemática aos doze anos e leu e compreendeu as obras filosóficas de Immanuel Kant aos 13 anos, muito cuidado – longe de ser um futuro Albert Einstein, o precoce autor dessas façanhas, ele não passa de um portador de necessidades especiais, que precisa com urgência dos cuidados de uma escola inclusiva, a exemplo das crianças mentalmente retardadas. É o que se deduz do Pla­no Nacional de Educação 2011-2020, que – a exemplo de toda a le­gislação educacional e de toda a produção acadêmica – trata o aluno su­perdotado da mesma forma que tra­ta o aluno com deficiência mental.
A Meta 4 do Plano Nacional de Educação é taxativa: “Univer­sa­lizar, para a população de 4 a 17 a­nos, o atendimento escolar aos(às) alunos(as) com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, preferencialmente na rede regular de ensino, garantindo o atendimento educacional especializado em salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços es­pe­cializados, públicos ou comunitários, nas formas complementar e suplementar, em escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados”. E a Estratégia 1.9, que trata da creche e da pré-escola, também junta, nesse mesmo caldeirão pedagógico, vazado num estilo sofrível, os “educandos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento” e aqueles com “altas habilidades ou superdotação”.
Podem anotar: a Meta 4 do Plano Nacional de Educação será uma camisa de força para o aluno superdotado, que, com base nela, poderá ser obrigado – repito: obrigado – a estudar na falida escola pública, mesmo que uma escola privada de elite, apostando em sua inteligência, resolva conceder-lhe uma bolsa de estudos integral. E poderia ter sido pior: o projeto original do Executivo, referendado pela Câmara dos Deputados, não continha o termo “preferencialmente” – lacuna que não passava de uma estratégia para aprisionar todos os deficientes mentais na escola pública, levando de roldão os superdotados. Felizmente, devido à luta das Apaes (Associação de Pais e Alunos de Excepcionais), o Senado acrescentou esse advérbio de modo ao texto, atenuando o caráter impositivo da lei, que, ainda assim, continua se inspirando na “escola única” da União Soviética de Lênin, referendada por Paulo Freire, o santo padroeiro do marxismo de autoajuda, e seu discípulo Moacyr Gadotti.
Tecnicamente falando, a “rede regular de ensino” tanto pode ser pública quanto privada, além de conveniada ou comunitária, pois o que a caracteriza é o fato de integrar o sistema educacional progressivo, regido por lei, que se inicia na pré-escola e se estende à pós-graduação, passando pelos níveis fundamental, médio e graduação. Todavia, o que se constata, na prática, é que a expressão “rede regular de ensino”, especialmente quando se associa a alunos com deficiência, significa, na prática, “rede pública de ensino”, excluindo os estabelecimentos privados de sua definição. Toda a política de inclusão, alardeada pelo MEC desde a década de 90, tem como foco preferencial – e, às vezes, exclusivo – a escola pública, tomada praticamente como sinônimo de “rede regular de ensino”.
Prova disso é que a própria construção textual da Meta 4 só tem embasamento lógico se a expressão “rede regular de ensino” for lida como “rede pública de ensino”, caso contrário, é surrealismo puro. Universalizar o atendimento escolar para os deficientes mentais e superdotados de 4 a 17 anos significa tornar obrigatória a educação especial nessa faixa etária. Até aí, vá lá. Mas qual o sentido de se obrigarem os pais a matricular esse aluno na rede regular de ensino e, ao mesmo tempo, estabelecer que o “atendimento educacional especializado” – isto é, justamente o atendimento de maior sofisticação – só poderá ser feito em sala de recursos multifuncionais da própria rede regular ou em escolas e serviços especializados, públicos ou comunitários? Por que em estabelecimentos privados não pode? Desde quando a escola básica privada é inferior à pública, precisando ser complementada por esta última e não o contrário?
Tratando superdotado como deficiente
Quando se trata de alunos com retardo mental, ainda é possível vislumbrar alguma razão que justifique essa meta. Historicamente, o aluno com deficiência mental era excluído do convívio com alunos normais e não costumava ser aceito na rede regular de ensino, fosse ela pública ou privada. Por isso, acreditam os defensores da educação inclusiva, é preciso forçar sua matrícula na rede pública, para que ele não fique confinado no universo da deficiência que impera nas escolas especiais. Mas muitos desses alunos têm graves deficiências de comunicação e não compreendem normas básicas de convívio, exigindo o atendimento especializado. É onde entram as entidades comunitárias, como as Apaes e os Institutos Pestalozzi, que dispõem de mais experiência e recursos para lidar com esses alunos.
Já no caso dos superdotados, não faz nenhum sentido estabelecer que sua educação complementar deverá ser ministrada em estabelecimentos públicos ou comunitários, como se vê explicitamente no Plano Nacional de Edu­cação. No afã de tra­tar o superdotado como deficiente, as autoridades pedagógicas produziram uma meta surrealista, que consiste em obrigar o aluno com al­to desempenho intelectual a aprimorar seus conhecimentos na rede pú­blica de ensino, mesmo que esteja es­tudando numa escola privada. É isso o que restou escrito no Plano Na­cional de Educação, que, estilisticamente, contém trechos que parecem obra de analfabetos funcionais.
Como o mais tresloucado dos ideólogos não ousaria dizer que a escola pública é melhor do que a escola pri­vada (o Enem e o Ideb mos­tram o contrário), o absurdo dessa redação indica que os autores do plano nem estavam considerando a rede privada e, quando falam em rede re­gular de ensino, estão pensando exclusivamente nas escolas públicas.
Prova disso é que, nos documentos oficiais do MEC e nos estudos acadêmicos, o termo “superdotado” e “portador de altas habilidades” aparecem indissociavelmente ligados ao termo “inclusão”, como se o superdotado fosse um incapaz, precisando de alguém que o tome pela mão e o mantenha na sala de aula. É o que fica claro na “Avaliação do Plano Nacional de Educação 2001-2008”, elaborada a pedido do MEC por pesquisadores de quatro universidades (UFG, que coordenou o trabalho, UFMG, UnB e UFPE) e publicada em 2009 pelo Inep (Instituto Nacio­nal de Estudos Pedagógicos Anísio Teixeira). No capítulo em que avaliam a educação especial, os pesquisadores afirmam, taxativamente, que “entre os alunos com deficiência também estão incluídos os que possuem altas habilidades/superdotação, ou seja, grande facilidade de aprendizagem, o que os leva a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes”.
Na época da publicação desse estudo, fiz a seguinte observação: “Que não se pergunte aos acadêmicos como uma ‘grande facilidade de aprendizagem’, que leva o aluno a ‘dominar rapidamente conceitos’, pode ser considerada uma ‘deficiência’ e não um verdadeiro prêmio. De duas uma: ou a pedagogia progressista é ela própria uma deficiência mental ou seus protagonistas precisam, com urgência, de uma camisa de força”. Mas esses professores universitários que, a exemplo do MEC, tratam o aluno superdotado como deficiente são os mesmos que não acreditam na deficiência mental e acham que todos os cérebros são potencialmente iguais – isto é, não passam de uma tábula rasa a ser escrita apenas pelo ambiente, sem reconhecer as influências genéticas na formação da inteligência. Por isso, há mais de duas décadas, as universidades travam uma guerra de ódio contra as Apaes, obtendo sua primeira vitória já na Constituição de 88, cujo artigo 208 já estabelece que a educação do deficiente deve ser feita preferencialmente na rede regular de ensino.
Universidades querem acabar com Apaes
A produção acadêmica sobre educação inclusiva, tanto de deficientes quanto de superdotados, é uma prova de que as universidades querem acabar com as escolas especiais. É o que se infere desta declaração dos especialistas que avaliaram o Plano Nacional de Educação a pedido do MEC: “Não cabe o conceito de deficiência severa a qual alguns estudantes não estariam aptos a frequentar a escola. Ele reproduz uma visão homogênea de ensino e aprendizagem que historicamente tem justificado a exclusão escolar de pessoas com deficiência. A meta [de manter escolas especiais] deverá, portanto, ser excluída”.
Ocorre que as escolas especiais são as únicas capazes de acolher crianças que não conseguem comunicar-se com o mundo, pois nem mesmo sabem quem são, aprisionadas num eu devoluto, destituído de razão e palavras, sem a mínima noção de alteridade, como acontece, por exemplo, com as crianças que apresentam síndrome de Rett, uma anomalia genética do cromossomo X, descoberta em 1966 pelo neurologista e pediatra austríaco Andreas Rett (1924-1997), que ataca meninas entre 6 e 12 meses de vida, atrofiando-lhes o cérebro, anulando sua psicomotricidade e condenando-as a minguar, vegetativamente, numa cadeira de rodas.
Mas até crianças com essa síndrome os pedagogos querem condenar à escola regular, privando-as do tratamento personalizado da escola especial. É o que defende, por exemplo, o pesquisador Rogério Drago, pós-doutor em Educação e professor da Universidade Federal do Espírito Santo, onde é orientador de teses de mestrado e doutorado, além de ser o organizador de vários livros e autor de vários artigos sobre o tema. Em artigo publicado na revista da Faculdade Cenecista de Vila Velha, em 2012, Rogério Drago afirma que, “ao contrário do que muita gente pensa, pode não ser tão difícil assim” educar na escola comum uma criança com síndrome de Rett, ainda que isso demande mais tempo e recursos.
O pedagogo afirma que a escola regular deve oferecer às crianças com síndrome de Rett um espaço “estimulante, interessante, envolvente, instigante, de produção de subjetividades autônomas, criadoras e inovadoras, livres de preconceitos que possam impedir que a diversidade dos sujeitos se faça presente, numa proposta de escola inclusiva”. E conclui que o indivíduo com deficiência, no caso a criança com síndrome de Rett, ao “participar do contexto histórico e sociocultural da sociedade à qual está integrado”, entra em contato sistemático com outras pessoas, “apropriando-se dos conhecimentos e conceitos acumulados pela sociedade e pelas contribuições que pode receber das interações mantidas com seus pares” e, “num processo de apropriação e transformação, vai deixando sua marca como ser único na coletividade”.
Pedagogia despreza avanços da genética
Como se vê, a pedagogia brasileira sofre de um profundo autismo ideológico e se tornou completamente incapaz de perceber a realidade à sua volta. Se em nome do igualitarismo de Rousseau e Marx, ela nega os graves efeitos cognitivos de um dano cerebral como a síndrome de Rett, é evidente que vai negar também os efeitos positivos de um QI elevado, desprezando as raízes genéticas e hereditárias da inteligência, o que, na prática, significa matar simbolicamente o superdotado.
Useiras e vezeiras em responsabilizar o professor do ensino básico por todos os males do ensino, as universidades gostam de acusá-lo também pela suposta “invisibilidade” do superdotado na escola, mas essa invisibilidade ocorre, de fato, na academia, que historicamente negligenciou o aluno superdotado, tentando negar até mesmo sua existência.
Segundo dados da Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação, divulgados numa entrevista da professora Susana Pérez à revista “Ciência Hoje” de janeiro de 2007, até aquele ano só havia registro de um único trabalho de pós-graduação sobre superdotação no País, enquanto sobre deficiência já existiam centenas. Até então, só havia seis doutores formados com foco em superdotação (Pérez seria a sétima) e o número de mestres não chegava a 50. Hoje, esse quadro mudou, ao menos quantitativamente: já foram defendidas 45 dissertações e teses de mestrado e doutorado sobre superdotação e o MEC estimulou a criação de centros de apoio à educação dos superdotados em todos os Estados brasileiros. Mas, substancialmente, a política educacional para os superdotados continua a mesma – para o MEC, o superdotado deve fazer parte da “escola inclusiva”, o que significa rebaixá-lo a um nível intelectualmente inferior.
Em tese, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, promulgada em 20 de dezembro de 1996, prevê a aceleração escolar para o superdotado, permitindo-lhe concluir em menor tempo o programa de ensino, mas, na prática, isso raramente acontece – se é que acontece no âmbito da escola pública. A educação brasileira, desde o advento da famigerada pedagogia de Paulo Freire, nivela o aluno por baixo e, nos centros de apoio aos superdotados, não será diferente. É o que se depreende de um programa sobre superdotados produzido e veiculado pela TV Câmara em agosto de 2008, que contou com a participação da professora goiana Raquel Teixeira, então deputada federal pelo PSDB, e de professoras do Núcleo de Atendimento a Alunos com Altas Habilidades e Superdotação do Distrito Federal, escolhido pelo MEC para ser modelo para as outras 26 capitais brasileiras, onde foram implantados núcleos do gênero.
Quem pensa que protagonistas do referido programa foram crianças prodígios em matemática, línguas ou música clássica, engana-se – em meio a imagens de Pelé marcando gols, para ilustrar o conceito de gênio, os principais destaques foram um menino de 11 anos que se tornou campeão mundial de patinação e uma ex-moradora de rua que gosta de fazer poemas e desenhar. Parece piada, mas o menino se tornou um “superdotado” porque, além de ser repetente e tirar notas ruins em matemática e português, tinha péssimo comportamento na escola e em casa. Sua mãe procurou ajuda de um psicólogo e a criança acabou sendo classificada como superdotado por ser exímio e obcecado patinador. Tudo bem que esse seu talento esportivo fosse acolhido pela escola como atividade complementar, mas daí a premiá-lo com a matrícula num núcleo de superdotados é um acinte, que desestimula os bons alunos em matemática e linguagem, preteridos por um patinador, como se fosse possível construir uma nação sobre patins.
Superdotação justifica até o crime
Parece que o único superdotado, de fato, mostrado na reportagem era um jovem de 19 anos que estava participando da construção de um foguete na UnB, depois de integrar programas para superdotados desde os 11 anos. Mas seu talento no difícil campo da física foi colocado no mesmo patamar do talento de uma ex-moradora de rua que largou a escola aos 15 anos de idade e se entregou ao álcool. Aos 30 anos foi resgatada das ruas e, por alinhavar poemas e copiar desenhos, foi acolhida como superdotada – o que, definitivamente, não é. Na reportagem, após recitar uns versos singelos (que não exigiam habilidade nem talento e, ao menos parcialmente, foram copiados de terceiros, como dá para notar), ela se emociona e chora. É a superdotação sendo confundida com assistência social. Num ambiente assim, uma mente brilhante pode ser tolhida – não só pela falta de competidores, mas também pelo remorso, abdicando de dar o máximo de si para não parecer socialmente ofensiva.
Pasmem! Para esses especialistas, a superdotação não se confunde apenas com assistencialismo – ela serve até para justificar o crime. Num dado momento da reportagem, a apresentadora afirma: “E quando o talento de uma criança superdotada é ignorado?” A resposta é a imagem de Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, sendo preso pela polícia federal, enquanto a narração continua: “A pobreza e os problemas sociais podem fazer o Brasil perder essas inteligências para o crime. Violentos e engenhosos líderes de facções criminosas como Fernandinho Beira-Mar são apontados pelos especialistas como superdotados”. Então, a professora Olzenir Ribeiro, do Núcleo de Altas Habilidades do Distrito Federal, hoje doutoranda em educação, acredita que tem a chave para a compreensão da criminalidade, ilustrada por Beira-Mar, e afirma taxativamente: “A gente pode dizer que o talento precisa ser desenvolvido e trabalhado ou para o bem ou para o mal. E que se nós não conseguimos alcançar esse talento para o bem ele vai ser trabalhado para o mal”.
Tenho calafrios só de pensar que esse núcleo de especialistas em superdotação da UnB é o modelo do MEC. Para essa gente, os superdotados não passam de autômatos completamente incapazes de enfrentar os imprevistos da vida e se não forem confinados em estufas cognitivas, protegidos do mundo por babás pedagógicas, fatalmente vão-se tornar criminosos, colocando seu talento a serviço do mal para se vingar da sociedade que não os acolheu. Por esse critério, as cadeias estariam abarrotadas de escritores e artistas frustrados, começando por Machado de Assis, forjado pelas intempéries da vida, sem babás pedagógicas a dirigir seu talento. Felizmente! E o que dizer do grande Patativa do Assaré, nosso Homero sertanejo, órfão, cego, escravo da fome, trabalhando no eito aos oito anos de idade para ajudar no sustento da família? Esse, sem dúvida, tinha de ir para o cangaço. Só assim para se vingar do enorme descaso de que foi vítima.
MEC compara Jô Soares a Da Vinci
Esse vilipêndio contra os su­perdotados se acha presente no livro “Altas Habili­da­des/Su­per­dotação: Encorajando Poten­ciais”, de Angela Virgolim, publicado em 2007 pela Secretaria de Edu­cação Especial do MEC. Num quadro da obra intitulado “O Que Diz a História?”, conta-se que o professor de música de Beethoven disse que ele era “sem esperança” como compositor e que Einstein tinha dificuldade de ler e soletrar e foi reprovado em matemática. É uma forma sutil e invejosa de dizer que qualquer um pode ser Beethoven ou Einstein. Notem que o MEC não diz que Beethoven teve seu talento negado por “um” professor, o que seria normal, mas por “seu” professor. É como se o autor da “Nona Sinfonia” tivesse sido um completo fracasso musical antes de se tornar um gênio.
Mentira! Inteligência e talento são largamente hereditários, como sabe o povo, que criou o provérbio: espinho quando tem que furar já nasce com a ponta fina. Hoje, essa máxima é referendada pelas modernas pesquisas científicas sobre o cérebro, infelizmente ignoradas pela pedagogia brasileira. Praticamen­te todos os grandes músicos demostraram propensão para a música ainda em tenra idade. Com Beethoven não foi diferente. Ele começou a estudar música aos três anos, aos sete fez sua primeira apresentação pública e aos onze publicou sua primeira obra, as “Variações Dresslef”. No ano seguinte, seu professor de música, o cravista, organista e compositor Christian Gottlob Neefe publicou uma nota elogiosa sobre Beethoven, então com doze anos, numa revista especializada em música. E, aos 13 anos, Beethoven foi nomeado organista da corte, juntamente com Neefe, seu professor. Mais tarde, Haydn, então o maior compositor da Europa, insistiu para que Beethoven publicasse suas composições com o epíteto: “Discípulo de Haydn”, já que Beethoven fora seu aluno entre 22 e 24 anos.
Se a ideia de um Beethoven medíocre, vendida pelo MEC, não se sustenta, o que dizer do Einstein que foi reprovado em matemática? Einstein, de fato, teve problemas na escola devido ao seu gênio irascível, mas estava longe de ser outro “superdotado deficiente”, nos moldes prescritos pelo nosso MEC, em busca de uma babá pedagógica. “Uma crença amplamente difundida a respeito de Einstein reza que ele foi reprovado em matemática quando era estudante”, escreve Walter Isaacson, na biografia “Einstein: Sua Vida, Seu Destino” (Com­pa­nhia das Letras, 2007). “Bem, a in­fân­cia de Einstein oferece diversas ironias à história, mas essa não é uma delas”, continua o biógrafo e conta que, em 1935, ao saber que nu­ma coluna de jornal haviam dito a respeito de si que “o maior matemático vivo repetiu em matemática”, Einstein riu: “Nunca fui reprovado em matemática”. E acrescentou: “Antes dos quinze anos, já dominava cálculo diferencial e integral”.
Há uma clara tentativa da pedagogia brasileira no sentido de desvalorizar os superdotados, começando por engessá-los no ambiente desolador da escola pública, sob a ideologia da “educação especial numa perspectiva inclusiva”. Incluir superdotados? Não passa de contrassenso. O superdotado precisa não de escola inclusiva, mas de escola exclusiva. Ele deveria ser positivamente excluído das salas abarrotadas de alunos relapsos, desordeiros, drogados e intelectualmente medíocres para ser incluído em escolas de elite, onde seria estimulado pela convivência com seus iguais, num misto de diálogo e desafio. Mas, no Brasil, os pedagogos abominam a ideia de acelerar aluno superdotado para que ele adiante os estudos. Preferem apostar no que chamam de “enriquecimento”, que é dar conteúdo extra para o superdotado no contraturno, mantendo-o preso na série compatível com sua idade cronológica, ainda que muito aquém de sua idade mental.
Nos Estados Unidos, há 165 escolas públicas com altíssimo nível de ensino, destinadas exclusivamente a superdotados, mediante um rigoroso processo de seleção. Uma delas, a Escola de Ensino Médio Thomas Jefferson para a Ciência e Tecnologia, do Norte da Virgínia, oferece anualmente 480 vagas, mas atrai 3.300 candidatos, dois terços dos quais são superdotados. Os dados são do presidente do Instituto Thomas B. Fordham, Chester E. Finn Jr., em artigo publicado no “The New York Times”, em 18 de setembro de 2012, em que defende a ampliação dessas escolas para superdotados. Algo que, no Brasil, soa como anátema. É mais fácil o MEC derrubar escolas e construir no lugar campinhos de pelada.
Afinal, em seu livro oficial sobre educação de superdotados, o MEC não perdoa nem Leonardo da Vinci. Pelé aparece ao lado de Da Vinci como um dos “grandes gênios” de todos os tempos, que “deram contribuições originais e de grande valor à humanidade”, enquanto Jô Soares, chamado até de “multinstrumentista”, para espanto de um Gismonti ou de um Hermeto, é considerado tão versátil como o gênio da Renascença. Dizer o quê? Um país que confunde bola com cérebro e dá mais valor ao campo de futebol do que à sala de aula está fadado eternamente a comer capim.

Publicado no Jornal Opção, de Goiânia.

José Maria e Silva é sociólogo e jornalista.

http://www.midiasemmascara.org/artigos/governo-do-pt/15166-2014-05-01-20-44-54.html

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